terça-feira, 11 de novembro de 2014

O objetividade é o fantasma da pesquisa em jornalismo


  Acabei de chegar do 12º Encontro da SBPjor. O encontro científico aconteceu em Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul. Fui apresentar a comunicação individual "Para que serve o jornalismo? Um caminho para estudar as funções da instituição jornalística no Brasil" (apresentação aqui). O artigo foi o resultado da primeira pesquisa exploratória de aproximação do objeto em estudo pela Análise de Conteúdo, onde , aliás, eu descarto essa metodologia para a tese.

O resultado da pesquisa mostra alguns aspectos interessantes como um (trabalhoso) mapa semântico de 14 apresentações de sites noticiosos feito por iteração. O mapa foi formado a partir de 11 palavras-chaves retiradas das conceituações clássicas do jornalismo - na maioria a partir da concepção funcionalista-liberal do estadunidense Michel Schudson - e apresentar com percentuais demostrativos da adesão atual, atrasada e conservadora, das empresas jornalísticas, que se atêm à valores constitutivos e funcionalistas do jornalismo. Tanto de organizações de esquerda quanto de direita, o discurso sobre si mesmo é semelhante.

A mesa onde apresentei o trabalho foi feroz com os erros metodológicos do artigo, as escolhas dos sujeitos/ agentes do campo, com a amplitude da amostra, e com a forma, a forma, a forma.... Sequer deram ouvidos quando disse que já estava defasado, pois eu mesma já havia observado grande parte destes erros. Os expoentes defensores da forma, representados pelos professores Elias Machado (UFSC) e Mozahir Salomão Bruck (UFMG) estavam certos nos erros apontados, mas se perderam no propósito do evento. Estávamos ali para falar da "Pesquisa em jornalismo para o século 21: as audiências e a reconfiguração dos sujeitos", só para aproveitar para informar o tema do evento. E eu apontava resultados interessantes que não foram sequer considerados nos comentários. Um massacre desnecessário foi a avaliação geral de quem saiu daquela sala lotada.

Do que adianta apontar tantos erros e não sugerir uma única saída sequer? E de que adianta um evento científico do porte da SBPjor, se os esforços dos novos pesquisadores não fossem considerados? Um total contrassenso e desserviço à pesquisa empírica, principalmente à uma pesquisadora em formação que tentava fazer exatamente o que eles pregavam. Eu estava até aquele momento procurando o tal rigor científico cobrado nos artigos apresentados por aqueles professores naquele dia, pois ambos estavam ali para apresentar seus trabalhos -  Metodologias de pesquisa aplicadas ao jornalismo: um estudo dos trabalhos apresentados na SBPJor (2003-2004) ( Elias Machado, Julia Rohden Ramos) e Pesquisa empírica em jornalismo: natureza e dimensionamento dos corpora (Mozahir Salomão Bruck, Bruna Raquel de Oliveira e Santos, Rennan Antunes ). A única certeza, deles e minha, é que 'o papel social do jornalismo' não se atinge pela análise de conteúdo. Mas isso eu já sabia.

Após o bombardeio desproporcional da forma, me deliciei com o painel "Fronteiras Epistemológicas da Pesquisa em Jornalismo", com Carlos Franciscato e Fernando Resende. Em rota oposta, os professores incentivaram a interdisciplinaridade, observar a cultura e os sujeitos, e provocaram um debate rico e importante sobre esta filiação resistente e atrasada ao paradigma informacional. Muitos foram os protestos, lógico, quando se decreta a morte da objetividade. O professor Fernando Resende aposta que é hora do paradigma relacional, da chegada da cultura e da fricção entre os vários estilos jornalísticos. A objetividade é um fantasma mesmo, Resende, concordo.

No dia seguinte o debate voltou e avançou na mesa coordenada "Lugares e sujeitos do jornalismo contemporâneo", proposta pela professora Márcia Benetti (URGS). O jornalismo está se reinventando nas suas narrativas, nas estratégias discursivas e em como se relaciona com o sujeito. A objetividade não precisa ser acompanhada de um lide, de procedimentos pré-estabelecido de produção e de um único modo de dizer. Há saídas discursivas para o jornalismo, e o mercado as está experimentando. Espero que a academia comece a observar as transgressões já feitas com menos intransigência e aceite que o uso é subversivo, o pensamento acadêmico tem que acompanhar.

O resultado foi muito bom, valeu à pena atravessar o país. Espero estar em Mato Grosso do Sul ano que vem com mais coisas para mostrar.

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